Apesar do desempenho muito ruim dasvendas, a indústria automobilística voltou a aumentar a produção no fim de 2016. Em relação ao mesmo trimestre de 2015, a alta foi de cerca de 15% nafabricação de veículos leves, aponta Francisco Lopes, diretor da Macrométrica.
Diante dos sinais de que esse setor bastante importante para a produção manufatureira voltou a respirar, o expresidente do Banco Central melhorou sua estimativa para o crescimento da economia em 2017 para 1,4% e dá como certo que o país sai da recessão neste primeiro trimestre, considerando a variação do PIB em relação aos três meses imediatamente anteriores. “Não há a menor chance de o número não ser positivo”.
A visão destoa da que tem prevalecido entre a maioria dos economistas.Pessimistas por causa do indicadores de atividade, como a produção industrial, que cresceu apenas 0,2% em novembro, quando se esperava uma alta superior a 1%, os analistas consultados para o boletim Focus foram reduzindo estimativas e, no último relatório, projetavam crescimento de apenas 0,5% em 2017. Mesmo os mais “otimistas”, como LCA Consultores, Itaú, Rosenberg e BNP Paribas, projetam alta de cerca de 1% no ano.
“Mas mesmo esses números mais fracos escondem uma aceleração importante ao longo do ano, porque a média estará muito contaminada pelo que aconteceu em 2016”, diz Lopes. De fato, as projeções trimestrais dos analistas ouvidos pelo Focus indicam que o crescimento vai se estabilizar, na comparação anual, no segundo trimestre. No último trimestre de 2017, a variação do PIB deve ser positiva em 1,9%, em relação aos mesmos meses de 2016.
Os números de Lopes são mais positivos: crescimento médio de 1,4% no ano e alta de 2,4% nos três meses finais de 2017. “Estou mais otimista com os dados que saíram a partir de novembro, em particular em dois setores:
indústria automobilística e agricultura”, afirma ele.
Sempre olhando os dados na “ponta” o último trimestre de 2016 com o mesmo período de 2015 , Lopes nota que houve um avanço expressivo da produção na indústria automobilística, que aumentou 15%, embora os emplacamentos de veículos tenham recuado pouco mais de 10%. “De duas uma: ou o setor produziu para exportar, ou os estoques caíram na rede de distribuição”, diz ele, para quem a primeira opção é a mais provável, já que as vendas externas de veículos subiram, no último trimestre de 2016, cerca de 40% em relação aos últimos três meses de 2015, em unidades.
E, mesmo representando parcela pequena do PIB nacional, em torno de 5%, a indústria automobilística tem uma cadeia longa, o que significa que uma alta nesse setor puxa outros segmentos industriais. “Quando um setor como esse produz mais, gera renda, o que incentiva a demanda em outros segmentos, em um processo multiplicador que é característico dos ciclos econômicos”.
Para ele, o aumento das exportações é explicado principalmente pela taxa de câmbio real, que continua mais desvalorizada em relação ao nível de três anos atrás, apesar do real ter ganhado força ao longo de 2016. Segundo Lopes, em um mercado oligopolizado como é a indústria automotiva global, as decisões de exportações costumam ser resultado de cálculos internos de onde é mais vantajoso produzir a cada momento. “O nível atual da taxa de câmbio, mesmo após a correção parcial de 2016, junto com outros fatores, como a capacidade ociosa do setor, parece estar configurando um conjunto de parâmetros que favorece a produção no Brasil com as exportações dirigidas a abastecer os diversos mercados compradores”, afirma o economista em relatório recente. Com esse impulso, o setor deve encerrar 2017 com produção 7,5% maior do que no ano anterior.
Para Bráulio Borges, economista da LCA Consultores, as exportações estão favorecendo o resultado da indústria automobilística, que de fato foi bastante positivo no fim do ano passado. Considerando o nível de produção com
ajuste sazonal em dezembro de 2016, a produção industrial teria um crescimento de 28% entre janeiro e dezembro apenas se mantendo estável nesse período, por causa do efeito estatístico, diz. Além das vendas externas, porém, a estabilização do mercado interno e mesmo os estoques, que fecharam 2016 no mesmo nível de 2012, contribuem para a retomada do setor.
Depois de um ano marcado pelo fenômeno climático “El Niño”, o PIB agropecuário também deve ter uma virada de 2016 para 2017, observa o economista da LCA. Partindo das estimativas de safra do IBGE e do Conselho Nacional de Abastecimento (Conab), ele estima crescimento entre 7% e 10% do PIB agropecuário em 2017, depois de uma queda de 6% em 2016. As estimativas positivas para a safra também estão movimentando o segmento de bens de capital para o setor agrícola, afirma Lopes. As vendas internas de máquinas agrícolas tiveram aumento da ordem de 50%, enquanto o comércio de colheitadeiras subiu 80%, sempre no último trimestre de 2016, em relação aos mesmos meses de 2015. “A decisão de investir para produzir uma grande safra deve estar motivada pela rentabilidade esperada”, diz ele.
Borges, também um dos “otimistas” do mercado, com expectativa de crescimento de 0,9% para 2017, afirma que, se a Selic de fato cair para perto de um dígito a LCA projeta queda para 9,5% ao ano a recuperação pode ser
até mais intensa, com alta de 2%.
Lopes projeta que a taxa básica de juros deve chegar perto de 10% ao fim do ano, mas é mais cético em relação à possibilidade de a Selic chegar a um dígito. “Isso depende de muitas outras variáveis, inclusive o que vai acontecer
com os preços de commodities, como o petróleo”. Mesmo assim, vê condições favoráveis para os próximos anos. “Temos juros em queda, parte fiscal bem equacionada e a economia global deve ser reativada pela política econômica
do novo governo nos Estados Unidos. As pessoas falam que é uma recuperação modesta, mas olha o tamanho da queda. Está ótimo”, diz. Depois de fechar o ano crescendo perto de 2,5%, a economia deve manter ritmo semelhante, entre 2,5% e 3%, ao longo de 2018. “O que não é extraordinário, é o normal”.
Neste ciclo, o que vai demorar mais para reagir é o desemprego, que na melhor das hipóteses deve ter melhora modesta no ano. Para ele, o governo vai precisar tomar medidas para acelerar a recuperação do mercado de trabalho.
Fonte: Valor Econômico